terça-feira, 6 de setembro de 2016

Especial Círculo das Ideias (Conto por Conto): O mundo sombrio de Robert E. Howard #7: "O Povo Pequeno"

MINHA IRMÃ JOGOU o livro que estava lendo. Para ser exato, ela jogou em mim.  
— Tolices! - ela disse. - Contos de fadas! Me alcance aquela cópia de Michael Arlen. 
Eu fiz automaticamente, passei os olhos no volume que havia incorrido seu desagrado juvenil. A história era "A Pirâmide Brilhante" do grande escritor Arthur Machen. 
— Minha querida menina! - eu disse, - isto é, com certeza, uma obra-prima da literatura outré. 
— Sim, mas a ideia! - ela respondeu. - Eu superei contos de fada quando tinha dez anos. 
— Esse conto não tenciona ser uma exposição do realismo do dia a dia - expliquei pacientemente. 
— Muito inverossímil - ela disse, com a determinação de dezessete anos. - Eu gosto de ler sobre coisas que poderiam acontecer, quem eram "O Povo Pequeno" de uem ele fala, é o mesmo negócio de sempre de trolls e elfos? 
— Todas as lendas têm uma base nos fatos. - eu disse. - Há uma razão... 
— Você está me dizendo que tais coisas realmente existem? - ela exclamou. - Bolas! 
— Não se precipite, jovem dama - eu adverti, um pouco irritado. - Eu quis dizer que todos os mitos têm uma origem concreta que mais tarde foi modificada e disturcida de modo a ter um significado sobrenatural. Os jovens - eu continuei, aplicando um olhar de reprovação fraternal sobre seu beicinho, compreendem. O "Povo Pequeno" que Machen fala supostamente são descendentes do povo pré-histórico que habitou a Europa antes dos celtas virem do Norte. - Eles são conhecidos variadamente como turanianos, pictos, mediterrâneos e comedores de alho. Uma raça de pequenas pessoas escuras, traços de sua espécie podem ser encontrados em regiões primitivas da Europa e Ásia de hoje, junto com os bascos da Espanha, os escoceses de Galloway e os lapões. — Robert E. Howard
Ilustrado por Greg Staples


Ilustração de Leandro Moura
Escrito em 1932, "O Povo Pequeno" é até agora o menor conto do livro. Traduzido por Daniel Iturvides Dutra, ele expõe o ceticismo da jovem Joan em relação aos contos de fada.

O desenvolvimento disso é bem interessante. Descendentes de ingleses e nascidos na América, eles passam as férias no território inglês e começam a pesquisar as coisas locais: lendas, cultura e tudo o que pertencia aos seus ancestrais. 

A conversa toma rumos escusos, quando Joan decide passar a noite entre os imensos menires daqueles lados bizarros do Oeste.  Enquanto ela conversa com o irmão, ele a repreende em vão.

A aventura se desenvolve sobre a ancestralidade do casal de irmãos e sobre a crença e descrença sobre os pictos: raça que na literatura foi explorada por Machen e mais aprofundada por Howard e anexada nos Cthulhu Mythos.

OS CONTOS DE FADA - A INFLUÊNCIA DE CHESTERTON

G.K. Chesterton foi talvez o intelectual mais influente do século. Em processo de canonização na Igreja Católica, nasceu em 1874, foi um capitulo de um de seus livros mais famosos Ortodoxia, que deu base a Tolkien criar a vila dos Hobbits (mais especificadamente A Ética da Elfolândia). Criador de tipos variados, escreveu de tudo: crônicas, contos, matérias de jornal, romances (Ufa!)...

Durante o dialogo dos irmãos não se pode esquecer de sua influência sobre Howard, salientada logo na introdução do livro por S. T. Joshi e reforçada na biografia de Robert E. Howard por Rusty Burke.

Com um conceito de que passasse as eras e o que fica é a moral, ele abriu a porta para a criação da Era Hiboriana, onde Conan foi mostrado com muitas facetas. Nela, Conan foi rei, ladrão, marinheiro, mercenário e outras profissões marginais e que dependiam exclusivamente de inteligência e de força física.

Uma das crenças de Chesterton era que os contos de fada eram a forma mais moralizante de se educar uma pessoa. Com eles, se pode enfrentar a realidade, mesmo que a mais dura, de uma forma não conformada mais otimista.


Toda a felicidade do país das fadas está por um fio, um único fio. Cinderela pode ter um vestido tecido em teares sobrenaturais e reluzente com um brilho que não é deste mundo; mas deve estar de volta quando o relógio bater as doze horas. O rei pode convidar fadas para o batizado, mas deve convidar todas, ou haverá conseqüências terríveis. A esposa de Barba Azul pode abrir todas as portas menos uma. Quebra-se uma promessa feita a um gato, e o mundo todo desmorona. Quebra-se uma promessa a um anão amarelo, e o mundo todo desmorona. Uma garota pode ser a esposa do Deus do Amor em pessoa se nunca tentar vê-lo; ela o vê, e ele desaparece. Uma garota recebe uma caixa com a condição de não a abrir; abre-a, e todos os males do mundo escapam para cima dela. Um homem e uma mulher são colocados em um jardim com a condição de não comerem uma fruta; comem-na, e perdem a alegria em todas as frutas da terra. - Chesterton

Aproveitando o espaço, o Golem anuncia também uma parceria com a editora Ecclesiae: um especial de Natal voltado para G.K. Chesterton.



O AUTOR


Robert E. Howard nasceu em 1906, em Cross Plains, Texas, Estados Unidos. Criador de personagens variados como Conan, o bárbaro, Bran Mak Morn e Solomon Kane, fundou o que hoje é chamado de gênero literário ''Espada e Magia''. Influenciado pelo conceito de G.K Chesterton de ''história condensada'' que ''o valor principal da legenda para misturar os séculos, preservando o sentimento" ele cria a Era Hiboriana que une as eras históricas e culturais de maneira ampla: Europa medieval (Aquilônae Poitain), à fronteira americana (a imensidão picta e suas fronteiras), e dos cossacos (Kozaki) aos piratas elisabetanos (Free Broterhood). Autor de narrativas cheias de ação, magia e selvageria, se notabilizou no início do século XX como um dos expoentes da literatura nas Revistas Pulp. Se suicidou em 1936 após saber que sua mãe caiu em um coma terminal, deixando um grande legado literário.