sábado, 14 de janeiro de 2017

Especial Círculo das Ideias: A Poética Fantasia de Clark Ashton Smith

Clark Ashton Smith em 1912
A literatura Pulp dos anos 30 vem sendo redescoberta no Brasil, ainda que timidamente. Diversas editoras apostarem em nomes como H.P. Lovecraft e Robert E. Howard em suas publicações recentes. Exemplos são a editora Hedra, que lançou vários livros de bolso e coletâneas de contos de Lovecraft, bem como a Editora Clock Tower, que nos trouxe uma fantástica edição de contos de horror de Robert E. Howard, juntamente com republicações de sua conhecida antologia lovecraftiana. 

Lovecraft e Howard faziam parte do três pilares da Weird Tales, revista que publicava a maior parte da obra destes autores. O outro escritor, que completava o trio, era o californiano Clark Ashton Smith. Ele nasceu em 1893 e foi um talentoso artista autodidata. Aos 11 anos de idade começou a escrever sua ficção, fortemente influenciado pelos contos de fadas dos Irmãos Grimm e os contos árabes das Mil e Uma Noites; durante a adolescência, teve contato com os magníficos trabalhos de Edgar Allan Poe e William Beckford. Aos 17, Ashton Smith vendeu alguns contos para revistas da época, e aos 19 teve contato com a poesia do renomado francês Charles Baudelaire, além de conhecer também a ficção de Ambrose Bierce e Jack London (chegou a trocar correspondência com estes autores). Essa trajetória de escrita e leitura formou o alicerce do que seria sua obra: uma prosa cheia de poesia, pintada nas cores do horror e do fantástico.

Clark Ashton Smith em 1958
Apesar de começar a sua carreira publicando contos, Clark Ashton Smith teve forte destaque inicial com sua poesia (esta que Lovecraft admitiu ser um grande fã). Até 1925, Smith produziu poesia de forma prolífica, tendo escrito suas mais famosas obras do gênero nesse período.

De 1926 a 1936, Smith dedicou-se a escrever e publicar histórias curtas, retomando a produção de contos fantásticos que o iniciara no mercado literário. Ashton Smith influenciou fortemente autores como H.P. Lovecraft, e também foi influenciado por ele. Durante estes 10 anos, Smith publicou contos fantásticos ambientados em planetas mortos e mundos congelados apinhados de feiticeiros, bem como escreveu histórias que fizeram parte dos Mitos de Cthulhu, expandindo o universo criado por Lovecraft. 


Futuramente, após a morte de Lovecraft em 37, Smith abandonou a produção de contos. Boa parte das histórias de Smith foram publicadas em seis volumes na Arkham House, editora fundada pelo escritor August Derleth, com objetivo de publicar a obra do falecido Lovecraft e trazer em edições de capa dura as obras de autores notáveis da época.

Pintura sem título, por Ashton Smith, de 1926
Tendo deixado a escrita em 37, Smith voltou suas inspirações para outras formas de arte. Até 1961, quando morreu, ele trabalhou com pinturas, desenhos e principalmente escultura. Tentou também voltar a escrever poesia, mas perdeu o interesse com a falta da qualidade que seus versos apresentavam, em comparação com sua poesia dos anos 20. 

É notável observar que sua prosa foi algo muito diferente do habitual, na época. Por ser poeta e ter grande fascínio pelas artes plásticas, sua prosa continha descrições detalhadas como esculturas e muito lirismo. Os temas mais recorrentes em sua obra eram civilizações perdidas na Terra, algumas de raças anteriores ao ser humano; terras fantásticas como Hiperbórea, a Groenlândia pré-histórica famosa por seus feiticeiros; planetas habitados por alienígenas como Aihai (Marte) - tal tema, acredito, foi fortemente influenciado pela ficção de Edgar Rice Burroughs, com seus romances planetários de John Carte; selvas habitadas por plantas demoníacas; continentes perdidos em um futuro distante do planeta Terra, entre outros cenários quiméricos. 

Azathoth, esculpido por Ashton Smith
Apesar de sua originalidade e genialidade, Smith ainda é muito desconhecido no Brasil. Temos esperança de que a Editora Clock Tower, em seu projeto de trazer autores esquecidos ao público, nos presenteie com edições da obra de Clark Ashton Smith. Não custa sonhar. Algo que podemos apreciar e devemos agradecer são as traduções que o autor ganhou através de José Geraldo Gouvêa, que escreve no blog Letras Elétricas e é profundo conhecedor da obra de Smith. É possível encontrar a tradução (excelente, diga-se de passagem) de diversos contos do autor no blog. Os contos disponíveis são: As Abominações de Yondo; Abandonados em Andrômeda; A Paisagem com Salgueiros; Uma Noite em Malnéant; O Demônio da Flor; Vulthoom; Pegadas no Pó; Esquizofrênico Criador;. Também presente no blog está um excelente artigo sobre A Ficção de Clark Ashton Smith; recomendo fortemente que leiam, caso queiram um texto mais completo e informativo sobre a vida e obra do autor. 

Clark Ashton Smith foi um mestre do fantástico que merece ser lido e conhecido. Sua influência ainda ecoa na obra de grandes autores como Robert Aickman, Thomas Ligotti e Ramsay Campbell. Toda a obra de Smith - poesia, contos, desenhos, pinturas, esculturas e correspondência - se encontra em inglês no site The Eldritch Dark. Espero que estes breves comentários despertem o interesse de novos leitores do fantástico, para que busquem os antigos mestres esquecidos através do fascínio e curiosidade que o desconhecido horror nos provoca. Iä! Iä! Cthulhu fhtagn!